A formação do psicanalista é um caminho singular, profundo e, acima de tudo, experiencial. Diferentemente das formações tradicionais em saúde mental, como psicologia ou psiquiatria, a psicanálise possui uma trajetória formativa própria, pautada não apenas no conhecimento teórico, mas sobretudo na vivência subjetiva do próprio analista em formação.
A base da formação em psicanálise é sustentada por um tripé essencial:
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Análise pessoal: NenhumpodeNenhum sujeito pode conduzir o outro em um processo analítico sem antes ter passado por sua própria travessia. A análise pessoal é a experiência do futuro analista em sua própria divã, enfrentando suas resistências, traumas e inconscientes. Como diria Lacan, o inconsciente é o discurso do Outro — e escutá-lo em si mesmo é o primeiro passo para poder escutá-lo no outro.
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Supervisão clínica: A supervisão é o espaço de troca entre o analista em formação e um analista mais experiente. É ali que os casos clínicos são apresentados, ouvidos e atravessados pela ética psicanalítica. A supervisão é um exercício de humildade e de escuta, onde se aprende não a “resolver problemas”, mas a sustentar perguntas.
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Estudo teórico: A leitura atenta e contínua dos textos de Freud, Lacan e outros autores contemporâneos é fundamental. A sustenta teoria a prática, mas não a engessa. Em psicanálise, o saber não é dogmático — ele se construiu na escuta e no desejo de saber mais sobre o sujeito e seus modos de gozo.
O cenário analítico é um espaço privilegiado para que o sujeito fale livremente. A regra fundamental da associação livre cria as condições para que o inconsciente se manifeste. O analista, por sua vez, sustenta uma escuta flutuante, intervindo pontualmente — muitas vezes por meio de cortes, ocasiões e interpretações — para provocar deslocamentos no discurso do analisando.
É importante frisar que o analista não é um conselheiro, nem um solucionador de problemas.nãoSeu lugar é o de quem sustenta o enigma, de quem escuta o que não foi dito, de quem aposta na fala do sujeito e em sua capacidade de ressignificar suas experiências.
Ser analista é, acima de tudo, uma posição ética. Lacan nos lembra que a ética da psicanálise é a ética do desejo — não o desejo do analista, mas o desejo do sujeito, que se articula a partir de sua castração, de suas faltas e de seus traumas.
O analista deve estar avisado de seu lugar e de seu desejo, para não cair na armadilha de “salvar” o paciente ou de conduzi-lo para um ideal de normalidade. A escuta analítica respeita o tempo do sujeito, seus silêncios, suas repetições e, principalmente, sua singularidade.
A formação do analista nunca termina. Ela é contínua, atravessada por novas leituras, novas supervisões, novas análises. O analista está sempre se formando, porque está sempre se implicando — em cada escuta, em cada transferência, em cada afeto que emerge no consultório.
Se a clínica é a prática da escuta, a formação é a prática da escuta de si mesmo. Por isso, ser analista está em constante deslocamento, disposto a ser tocado, atravessado e, quem sabe, transformado pela fala do outro.